28.1.06

Conheci uma menina (XV)

Comecei por não entender o que se passava. Como se um não-entendimento pudesse ser começo de alguma coisa..
A multidão juntava-se em volta da montra e estacava. Ficavam calados, e voltavam pálidos, cavernosos, a pele como se tivesse sido encerada.. No meio da estrada os carros começaram também a parar, em tentativas fracas de perceber o que estava a acontecer. Até que alguém sussurrou perto de mim que já estava a ligar para o 112. "Atropelamento na rua 23..depressa, é uma criança!" e a multidão continuava a engrossar.
Nestas alturas aparece sempre um bombeiro ou alguém grita que é médico. Não podia ser uma criança. "Não pode ser." Não podia ser a minha criança. "Não pode ser." Não podia ser a Vera. "Não pode ser." Mas de repente estava frio e foi como se me afogasse num buraco de pesca dos esquimós. Cortados no gelo. De repente não estava ali e ninguém tinha sido atropelado, muito menos uma criança. Muito menos a minha criança..
Mas como se fazia para andar? Um pé à frente do outro e uma noção de equilíbrio..-não soube.

E começaram as gargalhadas que me eram tão docemente familiares e ao fundo da rua, de gelado na mão, a criança do vestido branco. Soube de novo correr, respirar e, mais que nunca, soube a tanto a vontade de não a perder. A Vera.
Chegou o 112 e soube-se depois que a criança atropelada morrera.
Mas, e então?..

21.1.06

a prostituição do sorriso.

5 euros - sorriso em estado comum de anormalidade, 2 (duas) horas.
10 (?) euros - sorriso em estado profundo de anormalidade, 2 (duas) + 3 (três) horas.



Num cinema perto de si.

lusco fusco.

fusca (para ti):

http://pulchraluscofusco.blogspot.com/

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18.1.06

outro dia 18

"Deixo para ti o que nunca te dei. Dei. Mas nunca te fiz sentir o que dava. Deixo-te toda a minha confiança, toda a minha paz. Que nunca te mostrei, mas que sabias (eu sei que sim!) que te estava prometida.
Um ano depois, sei que não houve outro dia tão triste, outro dia em que me fizesses tanta falta. Sei que não houve outro dia em que me custasse tanto aguentar tudo. O Sol, o vento, os choros. Fazes a falta do básico. Eras tão básica à minha volta. Fazias parte das pedras, parte dos meus ossos, de tudo o que fui até àquele dia. E às vezes eras má. Fazias de mamã. Como se tivesses o direito! (e tinhas, tinhas todo!). As vezes que me irritaste com o feitio provocador, o olhar de quem põe e dispõe das coisas como quer e lhe apetece.
E é por me teres feito sentir revolta e amor que me fazes tanta falta.
É por isso que um ano depois não estás enterrada em mim."

é só outro dia 18..

16.1.06

À minha janela 3

..e ouço, pela primeira vez, os pássaros que não dormem.

"twilight" ou "das 4 da manhã"

com este silêncio todo, ninguém acredita que é Lisboa à minha janela.

13.1.06

À minha janela 2

serei o jardim.
e a alma inquieta, onde
por falta de nós
não deixaste florir.

8.1.06

Conheci uma menina (XIV)

Soprei com força na vara que faz dar forma ao vidro.
Quis muito que rebentasse, mesmo contigo ao meu lado.
Imagina só - ter-te vidrada para sempre..

2.1.06

Conheci uma menina (XIII)

31/Dez/o5

Querida Vera,
Aqui o barulho suporta-se tão mal como a ansiedade pela chegada do novo ano.
Fuma-se à porta - para que ninguém sinta, veja.
Vive-se às escondidas, ainda.